III DOMINGO DO TEMPO DA QUARESMA  – Jesus e a samaritana

Caros irmãos e irmãs,

Para este domingo o texto evangélico nos apresenta o encontro de Jesus com a samaritana. O diálogo começa com o pedido de Jesus à mulher da Samaria: “Dá-me de beber” (Jo 4,5-7). Com um simples pedido de um pouco de água, ao meio-dia, inicia-se um caminho interior da samaritana, que irá culminar com a sua conversão.  O encontro de Jesus com a samaritana ocorre junto ao poço de Jacó. Trata-se de um poço estreito, aberto na rocha calcária e cuja profundidade ultrapassa os 30 metros. Segundo a tradição, teria sido aberto pelo patriarca Jacó.  Os dados arqueológicos revelam que este poço de Jacó serviu aos samaritanos entre o ano 1000 a.C. e o ano 500 d.C.

Junto a esse “poço” movimentam-se os personagens principais: Jesus e a samaritana.  A mulher aqui apresentada sem o nome próprio, pode ser um sinal de referência à Samaria, que procura desesperadamente a água que é capaz de matar a sua sede de vida plena.  A samaritana não tem nome, mas certamente vários nomes lhe foram impostos por ter tido cinco maridos e conviver com o sexto, que não é seu marido e, apesar disso, continuar com sede da água que só Jesus, esposo da humanidade, pode dar.  Ela se aproxima, em um dia ensolarado, para buscar água. Ela não tem nome porque é a própria humanidade que está procurando, no sufoco do calor, algo que sacie de uma vez por todas sua sede.

Quando Jesus diz: “Se tu conhecesses o dom de Deus e quem é que te pede: ‘Dá-me de beber’, tu mesma lhe pedirias a ele, e ele te daria água viva” (Jo 4,10).  Aquela mulher começa a interessar-se por essa água misteriosa. Mas, inicialmente, ela fica confusa. Parece disposta a remediar a situação de falência de felicidade que caracteriza a sua vida, mas ainda não sabe bem como.  É aqui que entra a novidade de Jesus. Ele senta-se “junto do poço”, como se pretendesse ocupar o seu lugar; e propõe à samaritana uma “água viva”, que matará definitivamente a sua sede de vida eterna (vv. 10-14). Jesus passa a ser o “novo poço”, onde todos os que têm sede de vida plena encontrarão resposta para a sua sede.  Sentando junto ao poço, Jesus se dá a conhecer como a fonte da qual a humanidade inteira bebe. A partir de agora não se deve mais beber água da Lei ou das instituições, porque foram superadas pela fonte de água viva que é Jesus.

No Antigo Testamento a água da fonte, água viva, simbolizava a vida espiritual que Deus dispensa (cf. Ez 47,1ss), mas também simbolizava a Lei como fonte de vida (cf. Eclo 15,1-3). No Novo Testamento o evangelista São João identifica a água com o dom do Espírito Santo (cf. Jo 7,37-39).  Em Cristo nós temos a fonte de todos os dons que podemos esperar do Pai. Na cruz, Cristo jorrou sangue e água no momento em que seu peito foi perfurado (cf. Jo 19,34). E Jesus mesmo chegou a afirmar que aquele que nele crê, nele terá como beber, pois do seio de Jesus sairão rios de água viva (cf. Jo 7,38).

Jesus está com sede, mas quem acaba pedindo água é a mulher, pois ele tem a água capaz de saciar para sempre a sede de todos: ‘Se tu conhecesses o dom de Deus e quem é que te pede: ‘Dá-me de beber’, tu mesma lhe pedirias a ele, e ele te daria água viva.  Quem beber da água que eu lhe darei, esse nunca mais terá sede. E a água que eu lhe der se tornará nele uma fonte de água que jorra para a vida eterna”(Jo Jo, 4,10.14).

A água que Jesus dá é o Espírito Santo, a força que vem de dentro e jorra para a vida eterna. A mulher e a humanidade tem sede dessa água e, por isso, pede: “Senhor, dá-me dessa água, para que eu não tenha mais sede e nem tenha de vir aqui para tirá-la” (Jo 14,15).

A mulher da Samaria responde à proposta de Jesus abandonando o cântaro, que passa a ser inútil e, correndo, vai anunciar aos habitantes da cidade o desafio que Jesus lhe fez.  Atentemos no pormenor do “cântaro” abandonado pela samaritana, depois de se encontrar com Jesus.  O “cântaro” significa e representa tudo aquilo que nos dá acesso a essas propostas limitadas, falíveis e incompletas de felicidade. O abandono do “cântaro” significa o romper com todos os esquemas de procura de felicidade falsa, para abraçar a verdadeira e única proposta de vida plena.

O vínculo com Jesus transforma completamente a vida daquela mulher, que corre imediatamente a comunicar a boa nova ao povo da aldeia vizinha: “Vinde ver um homem que me disse tudo quanto fiz. Não será ele o Messias?” (Jo 4,29). A revelação de Jesus, acolhida com fé, torna-se palavra proclamada ao próximo e testemunhada através das escolhas concretas de vida. Eis a missão dos crentes, que nasce e se desenvolve a partir do encontro pessoal com o Senhor.

A samaritana, depois de encontrar o Cristo que lhe traz a água que mata a sua sede de felicidade, não limitou em guardar para si a descoberta; mas partiu para a cidade, a propor aos seus concidadãos a verdade que tinha encontrado.  Por fim, ela contou a todos a respeito de Jesus, o que resultou em um reavivamento religioso junto aos samaritanos. Aquela mulher acreditou em Jesus. Encontrou a água que mata a sede. E vai levá-la aos outros, aos seus conterrâneos.

No diálogo entre Jesus e a samaritana vemos traçado o percurso espiritual ao qual somos chamados a redescobrir e a percorrer constantemente. Jesus quer nos levar, como fez com a Samaritana, a professar a fé em sua pessoa e depois, anunciar e testemunhar aos nossos irmãos a alegria desse encontro e as maravilhas que o seu amor realiza na nossa existência. A fé nasce do encontro com Jesus, reconhecido e acolhido como o Salvador. Quando o Senhor conquista o coração da samaritana, a sua existência se transforma e ela vai imediatamente sem hesitações comunicar a boa nova ao seu povo (cf. Jo 4,29).  Quando encontramos o Cristo sentimos necessidade e urgência de levá-lo também a todos os que nos rodeiam.

Chama a nossa atenção o caminho de conversão da samaritana: de pecadora a apóstola! Do fundo da miséria moral da sua vida, ela subiu em poucos momentos para as alturas da fé e do zelo em propagar o nome de Jesus.  Afinal, ela entendera e acolhera o dom de Deus.  Seu coração se abriu para as riquezas do Espírito Santo.  Que também nós possamos, a exemplo da samaritana, ser sinal do encontro do homem sedento para com Deus, que tanto quer a nossa conversão.

Abramos também nós, o coração à escuta da palavra de Deus para encontrar, como a samaritana, esse Jesus que nos revela seu amor e a sua identidade. Que a Virgem de Nazaré interceda sempre por nós, para que possamos obter este dom e sermos também anunciadores da boa nova que Cristo trouxe ao mundo. Assim seja.

Anselmo Chagas de Paiva, OSB

Mosteiro de São Bento/RJ

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