O Evangelho volta a acontecer
Pe. Ricardo Figueiredo
Neste dia 10 de Outubro será beatificado o jovem Carlo Acutis. Nestes últimos dias de intenso trabalho a divulgar a sua vida e a sua espiritualidade, dei por mim a contemplar uma página do Evangelho que de forma muito particular parece-me volta a realizar-se neste dia. Conta-nos o Evangelho segundo São Mateus: «Naquele momento, os discípulos aproximaram-se de Jesus e perguntaram-lhe: “Quem é o maior no Reino do Céu?” Ele chamou um menino, colocou-o no meio deles e disse: “Em verdade vos digo: Se não voltardes a ser como as criancinhas, não podereis entrar no Reino do Céu. Quem, pois, se fizer humilde como este menino será o maior no Reino do Céu”» (Mt 18, 1-4).
Dentro e fora da Igreja, no mundo civil, eclesiástico, político, encontramos tantas lutas por ser «o maior». Esta sede de poder, de bens, de honra, ganha uma tal dimensão, tantas vezes, que as pessoas se tornam cegas da situação caricata em que tantas vezes se colocam com a sede desmedida de ser «o maior». A beatificação de Carlo Acutis surge como sinal eloquente da ação de Deus. Volta a colocar no meio dos seus discípulos uma criança e diz: «Se não vos tornardes como esta criança…»[1]. É na simplicidade, na humildade e na amizade que se revela o mais profundo da fé cristã. Neste jovem Carlo, vestido de calças de ganga e com ténis da Nike, aparece a simplicidade de que se deve revestir o amor a Jesus. Ele era insaciável na sua sede de levar almas para Cristo. Na simplicidade de criança falava com entusiasmo e amor dos milagres eucarísticos, das aparições de Nossa Senhora, da presença dos anjos na nossa vida e do perigo do Inferno e da alegria do Céu.
Na experiência espiritual de Carlo e no legado catequético que nos deixou, encontramos uma série de temas que tantas vezes se tenta esconder se não só das crianças, também dos adultos. Carlo falava com uma extrema seriedade e certeza da presença real de Cristo na Eucaristia e quando alguém lhe disse que havia teólogos que diziam que essa presença era só simbólica, respondia sem medo: «Estão errados»[2]. Só assim se compreende o seu amor a Jesus na Eucaristia.
No final da sua vida Carlo pode dizer que Nossa Senhora «foi a única mulher da sua vida»[3]. Numa sociedade tão sexualizada, em que tantas vezes se defende que tudo é permitido, encontramos este jovem de 15 anos que vive uma pureza de corpo e de coração sem igual. Esta permanente consagração a Nossa Senhora – que ele repetia muitas vezes – mostra como a pureza é possível e não só desejável. Muitos cristãos acreditam nisto, mas o peso do ritmo louco da sociedade por vezes faz com que duvidem.
Anjos e demónios. Vivemos numa sociedade que se esqueceu do invisível e apenas tolera a razão prática e só vive para o que é material. Carlo, na sua devoção aos anjos, vem lembrar todos os cristãos da necessidade de se voltar para as realidades imateriais. Com efeito, «a nossa meta deve ser o infinito, não o finito»[4].
Finalmente, Carlo tinha uma consciência muito viva das realidades últimas da vida do homem. Preparava também uma exposição sobre o Inferno, o Purgatório e o Paraíso. Na pregação dos pastores da Igreja falta muitas vezes falar destes temas. Tem-se medo. Às crianças, quase que se não fala do perigo do Inferno e de quão feio é o pecado. Carlo ficou muito impressionado com o facto de, em Fátima, Nossa Senhora ter mostrado àquelas crianças o Inferno. As verdades eternas são para ser apresentadas sem peias, sem medo.
Neste dia o Evangelho de Jesus volta a acontecer e, no centro da Igreja, volta a ser colocada uma criança e Jesus diz-nos: Se não vos tornardes como esta criança… Hoje recebemos muito mais que um exemplo de vida e do reconhecimento de um intercessor no Céu. Recebemos um plano de conversão, antes de mais da nossa vida pessoal e, depois, de toda a vida da Igreja. Assim Deus nos ajude e o Beato Carlo Acutis por nós interceda.