Dinâmica da Revelação de Deus Uno e Trino , o ser humano criado à imagem e semelhança e o processo de inspiração catecumenal
Diác. Adelino Barcellos Filho – Diocese de Campos
Ouvimos muitas vezes em nossas catequeses: “Deus é um mistério”; “São três pessoas e um só Deus: o Pai é Deus, o Filho é Deus, o Espírito Santo é Deus”; “São três deuses?” “Nããão, três pessoas em um só Deus”.
Pela repetição e/ou memorização, dificilmente se fará a experiência da Graça e do “mergulho” no conhecimento e consequente contemplação deste Mistério, revelado em Jesus Cristo, na ação do Espírito Santo. Tommaso (2015, p. 121) expõe o seguinte, “O Mistério, na concepção de Bouyer, pode ser entendido como desejo de Deus. Este desejo está inscrito no coração do homem, que foi criado por Deus e para Deus”. “Em Deus vivemos, nos movemos e existimos” (At 7, 28). Deus revelou-se ao homem por Amor, vindo ao seu encontro; desta forma, lhe oferece uma resposta definitiva às perguntas que se faz sobre o sentido e a finalidade da vida humana.
Apesar de não faltarem iniciativas que possibilitem um “itinerário” de reinserção no processo de “amadurecimento na fé, na pertença eclesial”, na sinodalidade, apresentado pelo RICA – Ritual de Iniciação Cristã de Adultos. Há de se considerar que exista o grande desafio de aplicá-lo em nossa vivência pessoal, na prática evangelizadora, devido ao grande número de pastorais que surgem nas dioceses, em nossa experiência enquanto Igreja. Surge de imediato o questionamento: a razão poderia verdadeiramente renunciar à prioridade do racional sobre o irracional, à prioridade do Logos, sem se auto anular? Questionamento que gera deveras inquietação tão necessária à busca do conhecimento de Deus e a importante experiência pessoal e comunitária, vivida Nele e a partir Dele.
Entender o ser humano não é uma tarefa fácil, sobretudo nos dias atuais, por estarmos inseridos em uma sociedade complexa; mas, quando a questão é colocada à luz da Revelação de Deus é possível iniciar uma reflexão e aprofundá-la. Partiremos do princípio de entendimento da essência e natureza do ser humano, utilizando-nos dos elementos primordiais que o caracterizam enquanto tal, inteligência, vontade e “emoção”, com o auxílio dos estudos na área da Psicologia: São atributos da inteligência, o pensamento, a capacidade criativa, imaginativa, memória, de raciocínios e de juízos de valor (capacidade de discernir o que é bom), é a inteligência que facilita o autoconhecimento. Segundo Goleman (1995), através da “auto percepção, autocontrole, automotivação, empatia e aptidão social” 1 .Cobêro; Primi& Muniz (2006, p. 339) aponta também que, “o desenvolvimento do QE (coeficiente emocional), além do QI, é cada vez mais importante para o sucesso e sobrevivência” de qualquer setor ou grupo; -Quanto à vontade, através do seu uso, tomamos decisões importantes e são assumidos compromissos bem como as consequências da semeadura, decisão, escolha. Para isso é preciso ter vontade de conhecer-se. Não existe nenhum projeto de felicidade que exclui a vontade; embora Reis (2010, p. 12) aponte a partir das ideias de Rousseau dois conceitos distintos, “vontade particular e vontade geral”, esta segunda referida ao ser moral, em sentido coletivo. -Podemos apontar ainda que, os sentimentos ou força vital interior estão intimamente ligados à emoção, a interação de horizontalidade comunicativa e relacional do ser humano, desta maneira os sentimentos interiores vão se multiplicando ao longo das experiências, podem aparecer na forma de sentimentos inferiores (ódio, maldade, orgulho, ressentimento, inveja, etc) ou na forma mais sublime (Amor, Bondade, Perdão, Humildade).
Como se pode observar, apesar de existir uma notória distinção entre estas realidades, há a possibilidade de equilibrada unidade: quando somos mais racionais, criativos e utilizamos da memória, atributos da inteligência, isto não significa que 1 GOLEMAN, Daniel. Inteligência Emocional. Rio de Janeiro: Ed. Objetiva, 1995. expressamos de alguma forma a vontade e a emoção; da mesma maneira a vontade para tomar decisões e fazermos escolhas, assumirmos compromissos, isto não significa que não fizemos também o uso da inteligência e da horizontalidade da emoção; assim como a emoção, manifestada através da interação de horizontalidade comunicativa e relacional do ser humano, com o outro, possibilidade de desenvolvimento da sabedoria, não significa a exclusão do uso da inteligência e da vontade.
Só é possível iniciar o entendimento sobre a Dinâmica Trinitária (Pai, Filho e Espírito Santo), a partir da nossa condição dada pelo próprio Deus, Uno e Trino, enquanto Imagem e Semelhança, favorecida pela Graça Santificante.
Quanto ao Pai, podemos atribuir à Sua Pessoa as seguintes características: Inteligência Suprema; “Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis” (Credo Niceno-Constantinopolitano); Onipotente (todo o poder); Onipresente (presença universal e cósmica); Onisciente (possuidor de todo o conhecimento, de toda a ciência, sabe a respeito de todos, de tudo e de todas as coisas); Providente (tem o controle de todas as realidades) e Justo Juiz (ao conceder o “livre arbítrio” é fiel a Sua própria Liberdade, como fruto de Sua essência criadora), sua Justiça consiste na prática da Misericórdia.
Quanto ao Filho (Jesus Cristo) é a manifestação da Vontade do Pai, como nos confirma o CIC, número 65: “Cristo, o Filho de Deus feito homem, é a Palavra única, perfeita e insuperável do Pai. Nele o Pai disse tudo, e não há outra palavra senão esta. Desta forma, com a Revelação, o Filho possui duas naturezas: a natureza humana e a natureza divina, elevando ao seu ápice as possibilidades de resgate da dignidade de todo o ser humano, adulterada pelo pecado das origens, a desobediência.
Ao Espírito Santo, podemos atribuir a Emoção (Força da Vida e de Luz), que procede do Pai e do Filho, manifestada através da interação de horizontalidade comunicativa e relacional, com o ser humano, consumada pela Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo.
Desta maneira, as realidades, que denominamos de elementos primordiais, de caracterização do ser humano, inteligência, vontade e a emoção, há uma interligação entre elas e unidade do ser humano enquanto Imagem e Semelhança: quando somos mais racionais, criativos e utilizamos da memória, atributos da inteligência, isto não significa que expressamos de alguma forma a vontade e a emoção; do mesmo modo, a vontade, para as decisões e as escolhas, assumirmos compromissos, isto não significa que não fizemos também o uso da inteligência e da horizontalidade da emoção. A dinâmica destes “elementos” reflete a possibilidade de uma perfeita harmonia e equilíbrio, onde aponta também ao entendimento de uma perfeita unidade, na Trindade Santa, onde Maria Santíssima faz plenitude dessa experiência: Vida de Oração; Realização da Vontade de Deus (“Fiat”); Solidariedade (com a necessidade da família); Silenciar quando é preciso, contemplar; e, conformar-se ao desejo de Deus.
A Realidade Trinitária é norteadora de toda a Vida Cristã e exige por Si e em Si mesma, a necessidade de entrarmos em um processo sempre dinâmico, pessoal e comunitário, de cuidado, de sinodalidade. Assim, todo o planejamento nas questões catequéticas, referentes à evangelização, ao anúncio da Boa Nova, deve considerar como fundamental estas relações colocadas como pressupostos, pois é a partir desta realidade, que se pode contribuir com a comprometida ação participativa no Mistério revelado, seja na catequese, no culto de maneira geral (Sacramentos); sobretudo, naqueles Sacramentos considerados de iniciação cristã (Batismo, Eucaristia, Confirmação ou Crisma), na Vida da Igreja, no fazer teológico. Estar atentos que a Fé precisa ser trinitária, na vivência litúrgica, na convivência cristã, na sinodalidade.
Até o dia, em que seremos reconduzidos, com toda a criação, na Eterna Doxologia, enxertados no Coração Eucarístico, “por Cristo, com Cristo e em Cristo” devotarmos “a Deus Pai todo-poderoso, na unidade do Espírito Santo, toda honra e toda a glória, agora e para sempre“. Pelos séculos dos séculos sem fim. Assim seja.
(Baseado no TCC – Trabalho de Conclusão de Curso – Diác. Adelino Barcellos Filho – Convalidação Teológica – Claretiano Centro Universitário – Batatais/SP/2016, 35p. Nota: 9,5. PS: Esta reflexão teve início no primeiro semestre do ano de 1986.)