Consciência Negra: Missa marca memoria a Zumbi dos Palmares na Diocese de Campos

No dia 20 de novembro de 1965, tombava Zumbi dos Palmares, o grande ícone da resistência do povo negro e da luta contra a escravidão. Na Diocese de Campos (RJ) Dom Roberto Francisco presidiu no Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro Missa com a participação de agentes da Pastoral Afro-brasileira.

Ricardo Gomes – Diocese de Campos

Foto: Jércia Gomes

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Sábado (20/11) na Diocese de Campos, Dom Roberto Francisco Ferreria Paz presidiu Santa Missa no Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, dos Missionários Redentoristas fazendo memoria ao líder da resistência e da luta dos negros contra a escravidão, Zumbi dos Palmares. A celebração teve a participação de agentes da Pastoral Afro-brasileira. Concelebrou o Reitor do Santuário N S Perpétuo Socorro, Pe. Luis Carlos de Carvalho e o Coordenador da Pastoral Afro- brasileira da Diocese de Campos, Pe. Márcio André Ribeiro dos Santos.

A Coordenadora da Pastoral Afro-brasileira do Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, Salvadora Maria Ribeiro dos Santos recorda como iniciou a história no ano passado com a primeira reunião com o Reitor, Pe. Luís Carlos de Carvalho e este ano a Diocese de Campos implantou a pastoral no âmbito diocesano. Salvadora Maria destaca a inspiração do líder da resistência, Zumbi dos Palmares.

Uma luta para resgatar a liberdade e a dignidade do povo negro que continua sendo vítima de preconceito, racismo e violência. Para Salvadora Zumbi chama para lutar contra todo esse processo de desigualdade racial. E o líder dos Palmares representa uma voz, uma força que se levanta e precisa perseverar para a construção da dignidade do povo negro.

– A Pastoral Afro-brasileira está pronta para atender aos apelos da mãe negra Mariama que nos inspira a lutar pelo povo negro, enquanto povo de Deus, enquanto igreja. Somos chamados a tomar consciência acerca de nossas raízes e tradições históricas e refletir diante das desigualdades, da violência, do preconceito, do racismo e da intolerância que infelizmente ainda existem nosso país. – confidencia Salvadora.

Luta e resistência para quebrar todas as correntes

A Pastoral Afro-brasileira deve tornar a igreja a torna-la mais aberta a multirracialidade e promovendo a igualdade racial e a dignidade de toda pessoa para que todos tenham vida e a tenham em abundancia como quer Jesus Salvador que veio para salvar a todos não excluindo ninguém.” Dom Roberto Francisco Ferreria Paz – Bispo Diocesano de Campos.

Pe. Márcio André Ribeiro, Coordenador da Pastoral Afro-brasileira na Diocese ressalta que o racismo estrutural é visível no Brasil e não comum encontrar altos cargos com negros e muitas vezes no mercado de trabalho negros são relegados a cargos subalternos e a Pastoral Afro quer evangelizar a partir do diálogo com essa cultura e um convite a história dos ancestrais que foram escravizados e humilhados a trazidos em condições sub-humanas. Pe. Marcio recorda que muitos discursos sobre os direitos humanos e dar ao negro seu devido papel na sociedade é vivenciar esses direitos. E essa realidade ainda reflete na vida da igreja com poucos padres afrodescendentes.

-A Pastoral Afro- brasileira é uma necessidade que se impõe nestes nossos tempos na medida que situações de racismo, preconceitos e discriminação que achávamos terem sido superadas ao longo das últimas décadas na verdade estavam escondidas e voltaram à baila principalmente nos últimos anos. A igreja é universal e para todos os povos e quer dialogar com todas as culturas. – destaca Pe. Márcio André Ribeiro.

Num tempo marcado pela desigualdade e exclusão social imposta aos negros a figura de Zumbi revela que a luta continua. E neste momento a Pastoral Afro-brasileira se torna porta-voz dos negros. E no dia que celebra a Consciência Negra é tempo de lutar. Uma luta para mostrar a sociedade que ainda é tempo para mudar os rumos da história.

– Recordamos Zumbi dos Palmares na luta para quebrar correntes e os grilhões da escravidão, do preconceito e do racismo. E um momento de conscientização sobre a força e da resistência em defesa da dor e do sofrimento que a população negra vive no Brasil, desde a colonização. – comenta Salvadora.

Na opinião do Professor da Universidade Federal Fluminense Silvio Cezar de Souza Lima o dia da Consciência Negra mais que uma data festiva e de celebração do legado cultural negro na sociedade brasileira, esta é uma data de reflexão sobre as desigualdades raciais e de luta por cidadania e direitos para a população negra brasileira.

Desde os anos 70 grupos de ativistas negros comemoram o dia 20 de novembro como um dia de luta antirracista, celebrando a resistência à escravidão, reforçando a ideia de luta dos negros contra o regime escravocrata e posteriormente contra o racismo e a discriminação racial. Somente no alvorecer do século XXI é que a data se torna parte do calendário escolar, com a lei10639/03 e posteriormente é promulgada a data como feriado em diversos estados e municípios brasileiros.

– Ainda precisaremos lutar muito para construir um país livre das desigualdades raciais. O Brasil tem os piores índices de escolaridade, renda, emprego e moradia. 75 por cento de nossa população em extrema pobreza é negra. É um índice acima da composição desta população na sociedade brasileira que é de 56 por cento. Além de estar em maiores condições de vulnerabilidade sócio econômica, população negra é a que mais sofre vítima de violência. Segundo o Mapa da violência 2021 (IPEA), 77% das vítimas de homicídio no Brasil são negras. Um negro tem 2,6 vezes mais chances de ser assassinado do que um não negro. Na violência contra a mulher, 67 por cento das mulheres mortas eram negras. – reflete Silvio.

Lutar e resistir contra o racismo

Ir Vanusa da Silva Fortunato, agente da Pastoral Afro-brasileira do Santuário Nossa Senhora do Perpétuo Socorro para a celebração da consciência negra para recordar a luta de Zumbi dos Palmares, um lutador contra o racismo e a urgência da conscientização das pessoas sobre as atitudes de racismo e preconceitos na sociedade.

– Precisamos saber que todos somos igreja, independente da nossa raça ou cor. Precisamos conscientizar os negros que não se aceitam e vivem como fossem brancos. O racismo existe, a violência contra os negros cresce a cada dia e o desprezo que as pessoas tem conosco. Zumbi foi um que lutou contra o racismo e eu quero levantar essa bandeira pelo respeito e a dignidade da raça negra.- pontua Ir Vanusa.

Se reconhecer negro sempre foi um trabalho bastante árduo para nós enquanto pessoas pretas, pois quando olhamos ao redor, somos sempre representados de forma negativa, seja na mídia, novelas, ou dentro da sociedade.  Hoje, o trabalho que eu exerço dentro do movimento negro, que tenho orgulho em falar que sou um dos fundadores, é conscientizar e lutar para que as pessoas negras tenham o direito a dignidade. Que as pessoas negras possam andar nas ruas sem serem vítimas do genocídio que mata um corpo negro a cada 23 min. Ou serem confundidos com ladroes ou não serem bem atendidos quando entram em uma loja, pelo simples fato da sua cor de pele. Umberto Malaphaia – Fundador do MOABI – Movimento Afro Brasileiro de Itaperuna

Uma luta pelo respeito a liberdade de culto

Defender a liberdade religiosa é uma luta que une todos os credos religiosos. O Babalowô Ivanir dos Santos, Interlocutor da Comissão de Combate a Intolerância Religiosa, revela a atual situação alarmante de ataques em especial as casas de culto das religiões de matriz africana.

– O crescimento da intolerância religiosa que tem se demonstrado através de atos de incêndios de casas de culto e sua fase mais cruel são os traficantes “evangelizados” e nos impõem que temos de lutar e as autoridades públicas precisam cumprir o seu papel.- relata Ivanir.

O Bispo Diocesano de Campos, Dom Roberto Francisco Ferreria Paz emitiu em 2019 nota de repúdio aos constantes ataques as casas de culto de religiões de matriz africana. Dom Roberto Francisco defende a liberdade religiosa e lança repúdio aos atos de intolerância e violência contra religiões de matriz africana. Em Campos, seis terreiros foram fechados em Guarus e, na área central, nove foram invadidos e tiveram seus líderes ameaçados. Além disso, mais de 20 terreiros, espalhados por todo o município, estão submetidos a funcionar somente durante o dia.

– Expressamos como Diocese de Campos nossa solidariedade fraterna e apoio para com os irmãos/as pertencentes às religiões de matriz africana. Repudiamos e manifestamos nosso total desacordo e desconformidade com a perseguição religiosa, a intolerância e violência que levou ao fechamento de terreiros. O desrespeito à liberdade religiosa e à liberdade de consciência ferem profundamente a democracia, a convivência social e torna-se uma grave ameaça à paz. Nossa bênção de consolação e paz. –  relata Dom Roberto.

Racismo e Violência

No ano passado às vésperas do Dia da Consciência Negra o negro João Alberto Silveira Freitas foi assassinado foi assassinado por seguranças num supermercado , em Porto Alegre (RS), no dia 19 de novembro de 2020.  Para recordar o episódio o CONIC – Conselho Nacional das Igrejas Cristãs realizou um ato ecumênico com participação da a pastora Cibele Kuss (Fundação Luterana de Diaconia e Fórum Inter-Religioso e Ecumênico do RS), o pastor batista Clemir Fernandes, Iya Sandrali de Oxum (Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde e Fórum Inter-Religioso e Ecumênico do RS), a monja zen-budista Kokai (Fórum Inter-Religioso e Ecumênico do RS), o rabino Ruben Sternschein (Congregação Israelita Paulista), dom Zanoni Demettino (arcebispo Metropolitano de Feira de Santana), o cantor e poeta Zé Vicente.

A Aliança Inter-Religiosa “Minha Fé É Antirracista” é uma mobilização permanente contra o genocídio da população negra. Ao reunir entidades religiosas de diferentes credos e organizações de direitos humanos de todo o Brasil, convocamos fieis e cidadãos a manifestar sua posição contra o racismo, que divide profundamente a sociedade brasileira.

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