Eleições, discernimento e manipulação religiosa
A recente nota da Presidência da CNBB, de 11 de outubro, adverte, de forma clara, contra a exploração da fé e da religião para angariar votos no segundo turno. Torna-se uma apropriação indevida de símbolos e espaços sagrados para veicular conteúdos de campanhas políticas eleitorais. Desvirtua-se a finalidade, precípua e sublime do culto, para exaltar pessoas e conquistar, de modo inadequado, e antiético, votos de fiéis que são, dessa forma, cooptados e distraídos da sua devoção autêntica de glorificar ao próprio Deus.
Por outra parte, percebe-se, em certos ministros religiosos (pastores e padres), um comportamento próximo do abuso espiritual e da intimidação, ameaçando com a maldição do inferno ou até excomunhão aos eleitores que votarem no candidato contrário ao que eles defendem, como única alternativa. Esquece-se que a missão de um líder espiritual é formar consciências, não substituí-las (Amadeo Cencini), iluminar e chamar à reflexão, não determinar, coagir e direcionar o voto, cerceando-se gravemente a liberdade de expressão e o direito ao voto. Para esses religiosos que assumem a função de cabos eleitorais e que violentam a sacralidade das consciências dos fiéis, as pessoas tornam-se massa de manobra, ou rebanho gregário, que deve ser totalmente conduzido, sem o mínimo respeito, a suas preferências ou opções. Estes representantes do fundamentalismo religioso ainda interferem, de modo insidioso e violento, no clima eleitoral, praticando o terrorismo espiritual que divide, acirra os ânimos e gera atitudes de ódio, medo e desgosto pela atividade política.
O Cristo do Evangelho é o grande esquecido e desconhecido por estas práticas que tornam as eleições uma guerra suja, na qual, o único que importa é ganhar, passando por cima do respeito, do amor incondicional, da justiça, legalidade, verdade, e todos os valores do Reino que o Salvador veio testemunhar para guiar a humanidade a dignidade da filiação divina e da reconciliação. Resgatemos a política como a arte e a ciência do bem comum, da mais alta forma de exercer a caridade, e testemunhar, de modo inequívoco, o serviço e o amor incondicional a todas as pessoas. Deus seja louvado!
+Dom Roberto Francisco Ferreria Paz
Bispo Diocesano de Campos
Campos dos Goytacazes, 16 de Outubro de 2022